Ausência
2º Trilogia DesAmadas / Editora Nau / 2022
A regra do jogo era não estar, se afastar e, no limite, não existir. No cárcere, ausência parece que é projeto institucional: castigo. No país que possui uma das maiores populações encarceradas do mundo e onde o encarceramento de mulheres cresce em velocidade exponencial, fica parecendo que esse é o projeto. Não a possibilidade de mudança, não a chance de reaprender modos de convivência não lesivos. Não o projeto de se construir justiça, mas o seu extremo oposto, aquele que desumaniza, que aniquila. Romper com essas regras é condição de justiça e reparação. As mulheres reunidas neste livro, a seu modo, rompem!
Num encontro que é mais do que isso, é presença de e entre mulheres, o projeto institucional de eliminação de quem não se quer por perto é denunciado e desautorizado. São mulheres, são mães, são o que são, falando de falhas, de sentimentos e de esperanças. Neste processo se afirmam humanas como somos, buscando encontros (com os filhos e conosco). Neste processo, assinalam para olhos interessados que elas têm direitos!
Nosso país, que encarcera em massa principalmente quem é negra e quem é pobre, já assumiu em nosso nome compromissos e respon- sabilidades frente à própria Constituição, à Corte Interamericana de Direitos Humanos e à Organização das Nações Unidas de fazer dife- rente e garantir uma vida digna e os plenos direitos a residentes no país que estão vivendo no cárcere – e até agora não cumpriu. Este país conta com nosso silêncio. Conta também com nossa ausência.
As imagens e as palavras comoventes deste livro são uma forma de nos lembrar que se não nos fizermos presentes, os esforços dessas mulheres para continuar a ser presença na vida de seus filhos e, além deles, entre nós, na sociedade, será desperdiçado.
Esse projeto de ausência não pode ser aceito. Não em nosso nome.
Jurema Werneck :: Diretora-executiva da Anistia Internacional Brasil